segunda-feira, 18 de julho de 2011

Teologia Feminista Hoje

A teóloga Claudete Ribeiro de Araújo apresentou um quadro panorâmico a respeito dos Desafios e perspectivas das Teologias Feministas na América Latina. Veja a síntese de seu artigo.

(1) Contribuição que as teologias feministas vêm dando à produção teológica:
- A descoberta de um mundo pluricultural e multirreligioso, que gosta da diversidade e que não tem pretensão de se fechar em única experiência religiosa. O diálogo se dá com a apropriação e a somatória das experiências religiosas que alimentam o cotidiano. Assim, a Teologia é sempre plural porque as experiências religiosas também o são.
- A elaboração da hermenêutica da suspeita permite teologizar a experiência religiosa dos grupos culturais. Deus não está encerrado apenas na Bíblia ou nos textos sagrados.
- O uso de outras formas de linguagem. As canções, os poemas, as danças e os rituais também são formas orais e escritas de elaboração teológica.
- A superação da influência grega no pensar teológico, pois a reflexão não é mais dual e nem está em contraposição. Há uma reflexão com pensamento global na qual o pessoal não é separado do estrutural e nem o transcendente separado do imanente.
- A reformulação da teologia do sofrimento.
- A construção de novas imagens de Deus no discurso religioso. Como nas comunidades eclesiais existem homens e mulheres fez- se necessário usar muitas e múltiplas imagens para se falar de Deus.

(2) Dificuldades e desafios para uma produção feminista na América Latina:
- As estudantes de Teologia têm acesso a artigos e livros de Teologia escritos por homens e têm de provar seu conhecimento e sua aptidão para a produção teológica a partir de seus conhecimentos nesses escritos.
- Todos os livros sagrados foram escritos por homens e interpretados historicamente por eles. Também os mediadores do divino sempre foram homens:
- As mediações entre o divino e o mundo são visões masculinas e os processos de salvação sempre foram elaborados por homens. As religiões consideradas menores têm mediações femininas, mas essas são consideradas pejorativas e desqualificadas pela Teologia.
- As teologias feministas têm sido depreciadas por serem produzidas por mulheres que trazem sua experiência corporal na produção teológica. Essa desqualificação está ligada à depreciação milenar do corpo, na medida em que a Teologia se ocupou das “coisas do espírito”. Quebrar esse dualismo se faz necessário, pois a vida humana acontece no corpo assim como toda experiência religiosa.
- Muitos institutos de Teologia não têm pessoas com conhecimento de teologia feminista, não podendo assim multiplicar discípulos(as) ou mesmo acompanhar trabalhos que resultariam numa sistematização de temas teológicos importantes para a realidade atual e mais respostas para a realidade latino-americana.
- As religiosas pouco têm se despertado para a formação intelectual na Teologia e em outros saberes. Elas poderiam contribuir não só na refundação da vida religiosa a partir de perspectivas feministas, como também para diminuir as contradições existentes nas estruturas eclesiásticas na medida em que assumissem suas opções com mais profundidade e conhecessem outros espaços de atuação no mundo.

(3) Sugestões para o crescimento das teologias feministas na América Latina:
- Nova leitura da história, pois ao reler a história, as mulheres encontram espaços religiosos, contextos sociopolíticos, culturas e costumes. Descobrem que foram sujeitos e que sempre tiveram poder, resgatam a auto-estima que permite construir nova identidade. Somente a partir dessa leitura é possível criticar a cultura.
- Incentivo dos estudos superiores das mulheres, não apenas na graduação, mas nos estudos posteriores que as levem à conclusão de seus estudos, para que possam assumir os trabalhos acadêmicos nas universidades e nos institutos teológicos, preparando outras mulheres e homens em seus estudos, produzindo teologia a partir de sua experiência e ajudando a conhecer os diferentes diálogos que se vêm processando na base dos movimentos teológicos.
- Investimento concreto por parte das universidades e institutos nas mulheres preparando-as para os estudos teológicos e/ou contratando-as como professoras.
- Inclusão, na grade curricular dos cursos de Teologia, de disciplinas como a metodologia feminista e/ou os estudos feministas como matéria de teologia fundamental na elaboração teológica, permitindo assim que os novos estudantes de Teologia tomem conhecimento e aprendam bebendo das diversas produções teológicas que vêm sendo elaboradas nos diversos continentes.
- Construção de uma nova abordagem sobre sexualidade e sobre o tema mariano a partir da hermenêutica da suspeita, pois na construção teológica Deus foi sempre masculino e Maria foi sempre a mulher. Essa reconstrução sobre Maria precisa acontecer junto com a reconstrução da identidade de Deus, na medida em que se carregue Deus com as chamadas características femininas e Maria com as conhecidas características masculinas.

Por fim, as teologias serão cada vez mais fiéis a si mesmas na medida em que a categoria de gênero estiver presente nas produções teológicas (na teologia moral, na exegese bíblica, na teologia sistemática e fundamental, nas disciplinas auxiliares ou chamadas instrumentais). A análise teológica a partir do género não é exclusividade da teologia feminista, ela deve permear e carregar todo tipo de produção teológica, até a Teologia da Libertação, porque permite a desconstrução de conceitos e dogmas construídos no passado e a tradução da tradição. O gênero não é um problema das mulheres, mas da cultura e, portanto, diz respeito a homens e mulheres, O conceito de gênero permite mudar as relações entre as pessoas e, portanto, a realidade.

(Síntese de C. Ribeiro de Araújo, Desafios e perspectivas à produção teológica a partir da contribuição das teologias feministas in: AA.VV, Sarça ardente. Teologia na América Latina. Prospectivas. São Paulo: Paulinas – SOTER, p. 238-248)